ATÉ O TALO

Conceito de cozinha sem resíduo ensina a aproveitar o que jogaríamos no lixo, faz bem para a saúde e o bolso

Por: Julia Guglielmetti
Colaboração para a ECOA, de São José dos Campos (SP)

Abrir uma banana, comer a polpa e jogar a casca no lixo. Uma atitude tão comum que fazemos sem nem parar para pensar… Mas que deveríamos. A casca da banana também é comestível, tem sabor neutro que vai bem em receitas doces ou salgadas e tem duas vezes mais potássio e mais vitamina C do que a polpa. Mas, então, por que a jogamos fora?

“É um preconceito muito enraizado que trazemos de gerações passadas, de quando a sociedade superou períodos difíceis e passou a valorizar a fartura, gerando muito desperdício de comida”, explica a nutricionista Camila Kneip.

Não é só da banana que estamos falando. Cascas, folhas, talos e sementes de muitos alimentos que poderiam ser aproveitados vão direto para o lixo. O desperdício também acontece com comidas que estragam na despensa e na geladeira. De acordo com um relatório da Embrapa de 2018, cada brasileiro desperdiça, em média, 41,6 kg de comida por ano.

Agora, o mundo passa por uma crise. Com mais de um milhão de casos confirmados de pessoas infectadas pelo coronavírus, muitos estão em quarentena para tentar frear a disseminação da Covid-19. Negócios estão fechados, funcionários foram demitidos, autônomos estão sem trabalho e muitas famílias estão sem renda. Esta fase difícil pode ser um bom momento para mudar hábitos e quebrar tradições alimentares que já não fazem sentido. Acabar com o desperdício e usar os ingredientes integralmente ajuda a economizar dinheiro e ainda traz benefícios à saúde.


A valorização do alimento em tempos de crise

A maneira como olhamos para os alimentos também é um fator para reduzir a produção lixo, uma questão importante durante o isolamento social. As ruas estão mais limpas, porém a geração de resíduo domiciliar cresceu em mais de dez por cento, e deve chegar a 15 a 20% a mais.

Utilizar os vegetais em sua totalidade, preparando refeições com cascas, talos, sementes, folhas e outras partes que seriam descartadas, é um primeiro passo importante para reduzir a quantidade de lixo gerado em casa. Além disso, esse aproveitamento reduz a necessidade de sair para comprar comida durante a quarentena e ajuda a economizar nas compras de supermercado.

Com essa prática, é possível preparar mais receitas, com menos alimentos.

A chef Regina Tchelly é a idealizadora do Favela Orgânica e conta que “o projeto trabalha com o ciclo da vida, transformando tudo o que costuma ser jogado fora em pratos saborosos”. A valorização dos alimentos é fundamental para ela.

É importante modificar a nossa relação com a comida. Fazer valer a pena o sacrifício de, por exemplo, aguardar meses para poder colher a cenoura. É saber que uma bananeira precisa de dois anos para dar um cacho da fruta e que podemos aproveitar o pé todinho.

Regina Tchelly, chef do Favela Orgânica

Michelle Bedolini, especialista em nutrição do Sesi-SP, estima que a utilização das partes não convencionais ajude a reduzir em até 40% o custo com a alimentação de uma família: “é bom ter um planejamento adequado para otimizar ao máximo os alimentos. A principal vantagem é economizar, além de não precisar sair tanto de casa durante a quarentena.”

“A economia financeira e a de lixo gerado é, em média, de um terço do valor ou do volume total dos alimentos. Mas esse número é variável. Ao comer apenas a polpa da melancia, por exemplo, três quartos da fruta —casca, entrecasca e sementes— estão sendo desperdiçados. Quando compramos a melancia, estamos pagando principalmente pela casca, que é o mais pesado.” Camila Kneip, nutricionista.


Aproveitamento integral e reaproveitamento

Reaproveitamento é quando a gente pega o que sobrou do arroz e transforma em bolinho de arroz, por exemplo. Ou quando se usa o feijão para fazer tutu. O aproveitamento integral é utilizar o alimento in natura na sua totalidade. Você pode tomar um suco da polpa da melancia no café da manhã, preparar um refogado com a casca no almoço, usar a entrecasca ralada em canapés e assar as sementes para fazer farinha. Com uma fruta, você faz quatro receitas.

Natália Rodrigues, nutricionista da ONG Banco de Alimentos


Mais nutrientes por porção

A saúde também ganha com uma cozinha sem resíduos. “O aproveitamento integral dos alimentos é muito benéfico para aumentar o valor nutricional das refeições. Muitas vezes, partes que costumam ser descartadas têm mais ferro, mais proteínas e mais vitaminas do que a polpa”, fala Natália.


Mas dá para usar todas as partes dos vegetais?

Regina diz que sim. Com criatividade, ela usa praticamente tudo. “Faço um estrogonofe maravilhoso usando chuchu com o olhinho. Aproveito a entrecasca da mandioca para recheio de panqueca, só escaldando e picando. Também gosto de fazer ceviche de jiló e quiabo cru.”

Ela conta que um dos seus maiores sucessos é o salpicão de batata-doce crua que, ao ser ralada com casca, ganha aspecto de peito de frango. “Daí é só pingar gotas de limão para não oxidar. Boto tomate, pimentão, manjericão, páprica, maçã, shoyo e azeite? Fica maravilhoso.”

A dica da nutricionista Natália Rodrigues, da ONG Banco de Alimentos, é sempre testar. “Você pode observar quais são os vegetais mais consumidos na sua casa e anotar quais são as partes desses alimentos que você mais joga fora. A partir daí, vale pesquisar por receitas que indiquem como aproveitá-las”, explica.

Natália comenta que utilizando os temperos certos, é possível fazer receitas salgadas ou doces. “De início pode parecer algo muito fora da realidade, mas precisamos ter a mente aberta e pensar no alimento como um todo.”

Já que é testando que se aprende…

Sementes
Para transformar as sementes em petiscos, basta torrá-las. Dá para usar sementes de abóbora, girassol, melancia, melão etc.

Flores
Beatriz Carvalho, da empresa de educação ambiental por meio da alimentação Mato no Prato, indica as flores de manjericão para aromatizar a água e as de cebolinha para decorar pratos. Flores de abobrinha ficam deliciosas assadas e as do maracujá também ajudam na apresentação das preparações.

Folhas
As folhas podem ser consumidas cruas, refogadas ou até como recheio de tortas e bolinhos. Folhas de beterraba, por exemplo, são muito saborosas como salada. Já a rama da cenoura picada substitui a salsinha. Folhas de couve-flor, brócolis e rabanete também são muito nutritivas. “Uso algumas folhinhas de pitanga no suco e folhas de pimenta na salada”, conta Beatriz.

Cascas
É possível aproveitar a parte externa do melão, da melancia, da abóbora, da banana, da laranja, da beterraba, da batata e da maior parte dos vegetais. As receitas vão até onde a criatividade levar, e as cascas podem ser assadas, cozidas ou transformadas em doces.

Entrecascas
A parte branca de frutas e raízes como maracujá, melancia, melão e mandioca podem ser aproveitadas cruas ou refogadas em recheios de panquecas, tortas e canapés.

Talos
Os talos podem ser picados finamente e cozidos para amolecerem. Daí, é só misturar no arroz, no feijão, na farofa e até no yakisoba.

Partes rígidas
O aconselhado é cozinhá-las. A nutricionista Camila Kneip comenta que algumas podem não ser muito palatáveis. “Quando são muito duras, a recomendação é assar, triturar e fazer farinha. A coroa do abacaxi, por exemplo, até pode ser utilizada, mas é difícil deixá-la gostosa. Então, ela pode ser replantada em um vaso. Em último caso, vale colocar na composteira. Assim se encerra o ciclo do alimento.”

REPRODUÇÃO

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